Há um novo vídeo no nosso canal no Youtube, veja abaixo a transcrição ou assista ao vídeo se assim desejar.
A quantidade de vídeos de supostos objetos voadores não identificados circulando pela Internet é enorme, e sua grande maioria segue o mesmo padrão: luzes filmadas contra um céu noturno ou diurno. Algumas destas filmagens são mais nítidas e firmes, enquanto que outras são mais borradas e trêmulas. Algumas destas luzes são de uma única cor, enquanto que outras apresentam várias cores ou mudanças nas mesmas. E algumas delas têm formato de ponto ou de esfera, enquanto que outras parecem amorfas e irregulares. Aqueles que as observam e aqueles que assistem aos vídeos nunca tem plena certeza do que estão vendo, gerando muita confusão quanto a sua real natureza.
Seria algo exótico e fantástico, como uma espaçonave alienígena, talvez?
Nunca podemos descartar qualquer possibilidade, mas a maioria dos vídeos parecem ser algo de explicação bastante prosaica e simples. Estrelas, fenômenos astronômicos, satélites, aeronaves, drones, balões, aves, insetos, show de luzes, fenômenos atmosféricos e climáticos, sinalizadores e iluminação acabam explicando a maioria dos casos, especialmente aqueles filmados ou fotografados.
Se você duvida, dê uma olhada nessas fotos por exemplo.
Elas são muito similares às imagens que muitas pessoas têm gravado e postado nas redes sociais. O que você acha que elas são?
E se eu lhe disser que elas foram obtidas em um simples laboratório fotográfico, para demonstrar como câmeras têm limitações quanto ao que podem registrar?
Para continuarmos, preciso explicar alguns rápidos conceitos de física óptica, em especial aqueles aplicados ao tipo de dispositivo mais usado para capturar vídeos deste tipo: o Smartphone.
Mas antes, curta e compartilhe o vídeo, e se inscreva no canal. Isso me ajudará demais, e vai te deixar ligado nos próximos vídeos que lançarmos por aqui.
Basicamente, nossos smartphones tiram fotos de maneira digital. A luz do objeto fotografado é exposta a um sensor de imagens de maneira semelhante à fotografia analógica, onde o filme fotográfico fazia o papel do sensor de imagem. A luz refletida por qualquer objeto, e que é capturada pelo sensor é muito difusa, e chega ao sensor de maneira muito desordenada, gerando um efeito chamado desfoque.
Tal problema é resolvido com o uso de um coletor de luz, que nós estamos acostumados a chamar de lente. A lente possui propriedades de curvatura que conseguem concentrar e ordenar a luz, resolvendo a dispersão que ela apresenta naturalmente, fazendo com que ela chegue de maneira ordenada ao sensor.
Porém, as lentes não fazem milagres, e o vídeo a seguir, da Canon Imaging Ásia, explica bem isso.
Como você pode ver, para funcionarem bem, as lentes precisam que você obedeça à distância focal, que é a distância correta a qual um objeto fotografado tem que estar da lente, e esta, do sensor. Caso isso não seja obedecido, você terá imagens não apenas ruins e desfocadas, mas que também podem lhe dar uma ideia errada do que está vendo. Por isso, toda câmera tem controle de foco, sendo que as câmeras digitais em geral trabalham com ajuste de foco automático, para facilitar que pessoas leigas em fotografia tirem imagens boas no dia-a-dia.
Apesar de prático, o autofoco é péssimo para filmar ou fotografar objetos e luzes no céu, uma vez que dependem de informações e referências do ambiente para funcionar bem, algo que em imagens tiradas do céu não existe. Quando uma pessoa filma o céu, a câmera perde todas as referências para que seu autofoco funcione, e normalmente, acaba entendendo que um objeto que está muito distante, como uma estrela, está muito perto, desfocando completamente. A lente ajusta seu foco com isso em mente, e aquilo que deveria ser um ponto de luz se torna um disco desfocado. Por isso a imagem na tela do smartphone apresenta um efeito de vai e vem em muitos casos, pois são as lentes tentando ajustar o foco em algo que, na verdade, elas não têm como focar, nos dando uma imagem irreal.
Além disso, a maior parte dos smartphones modernos vem equipados com câmeras e sensores muito bons, mas com conjuntos de lentes bastante limitados, em especial para imagens do céu. Mas se essas são imagens desfocadas, por que algumas delas não são simplesmente uma bola difusa? Porque algumas delas se parecem com um disco, um anel ou um halo?
Lembre-se do vídeo da Canon Imaging Ásia que vimos antes. A distância focal das lentes é diferente na borda e no centro, gerando aberração esférica, e elas variam dependendo da cor que compõe a luz capturada, gerando aberração cromática. Assim, dependendo da aberração presente pelo foco incorreto, a imagem de um ponto luminoso no céu se apresenta como um borrão, como um disco ou como um halo, semelhantemente à imagem de exemplo. Estes dois efeitos são responsáveis pela maior quantidade de imagens que levam a erros de interpretação nos casos citados. E como todos os smartphones do mundo funcionam praticamente da mesma forma nesta questão, pois todos são equipados com lentes esféricas, é normal que tenhamos tantos vídeos semelhantes pelo mundo. Soma-se a isso outros problemas de câmeras digitais embutidas nos smartphones, como os recursos de zoom digital e o ruído eletrônico causado por baixa luminosidade, e você terá imagens cada vez mais estranhas.
Além disso, existe um efeito chamado "turbulência do ar". De certa forma, quando olhamos para o céu e vemos uma estrela, temos que nos lembrar de que a luz da estrela está atravessando nossa atmosfera, que está repleta de gases que se movem e se agitam em ventos e concentrações diferentes o tempo todo, causando efeitos semelhantes à mudanças de cor e até mesmo de cintilação, que é a impressão de que as estrelas piscam.
Mas muitos objetos filmados não são de fato estrelas. O que seriam eles então?
A constelação de satélites da Starlink ainda é muito confundida com algo de outro mundo, mas um dos campeões de identificação incorreta ainda é o planeta Vênus, que devido a sua luminosidade extremamente alta, quando filmado daqui da Terra por um smartphone dotado de lentes esféricas, acaba mostrando algo irreal devido aos problemas aqui relatados. Este vídeo mostra um exemplo prático disso.
A luz que você está vendo ali foi identificada como o planeta Vênus. A pessoa que está fazendo a filmagem, um astrofísico espanhol, está propositalmente gravando o vídeo para demonstrar como os efeitos citados anteriormente causam imagens irreais. Ao dar o zoom, o autofoco se aciona, causando efeito de desfoque, e quanto mais ele tenta dar zoom, mais desfocado Vênus fica, oscilando entre desfoque e aberração esférica. Além disso, Vênus parece se mover porque os pequenos movimentos que ele faz com as mãos e braços criam esta ilusão, de que a luz se move diante de um fundo estático. Outro efeito observado é que, quando ele tira o zoom mantendo algumas casas na parte de baixo da filmagem, apenas mudando o foco, forçando um desfoque, a luz de Vênus parece aumentar de tamanho devido ao efeito.
Estas falhas de interpretação de luzes nos céus, mesmo a olho nu, não significam que as pessoas são ignorantes, despreparadas ou mal intencionadas. Na verdade, é muito fácil confundir um planeta com uma estrela, já que os modelos científicos que temos a respeito dos planetas os mostram sempre em escalas muito maiores do que aquelas que podemos ver a olho nu, daqui da Terra, em um céu noturno.
Estamos acostumados a pensar neles como nos são mostrados em imagens de poderosos telescópios ou em belas reproduções artísticas em 3D. Mesmo cientistas treinados, como físicos, têm dificuldades de identificar se algo no céu noturno é uma estrela, um planeta, um satélite ou, quem sabe, um legítimo OVNI. Isso se dá porque entender de astronomia é algo muito restrito, infelizmente. Escolas não capacitam nenhuma pessoa com este conhecimento, restando clubes de astronomia e o entusiasmo pessoal de cada um em aprender sobre o tema em cursos específicos.
Na antiguidade, o ser humano tinha uma relação muito mais próxima com o céu. As pessoas dependiam de uma interpretação correta das posições das estrelas e planetas para calcular calendários, realizar plantações e colheitas, planejar festas e navegar. Tudo isso foi se perdendo conforme novas tecnologias foram sendo inseridas em nossa sociedade, deixando tais informações restritas a poucas pessoas.
Mas hoje, no mesmo smartphone em que imagens enganosas são feitas, existem aplicativos que ajudam qualquer um a identificar melhor o que está vendo no céu, auxiliando a encontrar constelações, planetas e satélites em tempo real. Seu uso pode auxiliar pessoas a entender se o que estão vendo é algo realmente fantástico e inexplicável, ou se é algo mais simples.
Passada essa questão mais técnica e teórica, vamos a algumas informações mais práticas, ou seja, um passo a passo de fato.
Se você está vendo uma luz estranha no céu, a primeira coisa que tem que identificar é se ela está se movendo. Se estiver, como é que você pode ter certeza de que ela realmente está se movendo? Você tem que ter muito cuidado com a referência visual que usa para perceber esse suposto movimento. Evite usar prédios, árvores ou construções em solo como tal, pois a abóbada celeste se move. Você mesmo pode se mover sem perceber, e isso pode levá-lo a um erro de interpretação muito facilmente. O movimento das nuvens também pode lhe enganar, e além disso, como descrevemos antes, em gravações feitas com a câmera do seu celular smartphone, o melhor é usar o próprio céu noturno como referência.
Se a luz está se movendo em relação às estrelas, será um bom indicativo de que, de fato, a luz se move. Mas se ela não estiver se movendo, é muito provável que o que você esteja vendo um planeta. Como vimos antes neste vídeo, alguns planetas são muito mais brilhantes do que as estrelas. Vênus costuma ser o protagonista de diversos vídeos onde pessoas o filmam por achar que se trata de um OVNI, e nos meses de abril, no hemisfério norte, o mesmo ocorre com Marte, Júpiter e Saturno, pois além de mais brilhantes, eles estão próximos um do outro na abóboda celeste. E o mesmo ocorre com a estrela mais brilhante do céu: Sírios.
Em qualquer caso, veja se a luz que está observando no céu noturno coincide com algum desses planetas ou estrelas com ajuda de algum dos aplicativos que citamos antes. Eles são gratuitos para as principais funções que interessam a este vídeo, e são bastante simples e intuitivos. A tela que você está vendo agora é do Stellarum. Com ele, você pode identificar planetas, estrelas, constelações e satélites, seja em tempo real, seja em algum momento específico no passado. Ter um aplicativo como ele instalado em seu smartphone não apenas lhe permitirá fazer uma melhor identificação daquilo que estiver vendo, como também vai ser instrutivo, lhe ensinando muito sobre astronomia. Ele também será divertido, te dando um ótimo passatempo para quando estiver em algum local aberto durante a noite.
Agora, digamos que você tomou os devidos cuidados, observou os pontos de referência corretamente e constatou que o objeto realmente está se movendo em relação às estrelas. A segunda coisa que você tem que verifica, se ela está mesmo se movendo, é o comportamento dela.
Se for uma luz constante que não muda sua intensidade e nem pisca, podem ser duas coisas: se você a está observando durante o crepúsculo ou amanhecer, e a luz é muito brilhante, e se move muito, muito rapidamente, você provavelmente está olhando para ISS, a Estação Espacial Internacional. Tenha em mente que ela orbita a Terra a uma altitude muito baixa, de cerca de apenas 400 km. Então, em menos de 5 minutos, ela percorrerá toda a abóboda celeste do ponto em que você a está observando, o que é muito rápido. Além disso, ela só pode ser vista justamente nestes horários do dia, porque é justamente quando a luz do Sol reflete em seus painéis solares no ângulo exato relativo a qualquer observador na Terra. Para confirmar se o que está vendo é mesmo a ISS, você pode usar o mesmo aplicativo que mencionei antes, ou ainda o site de rastreabilidade da estação, que estará no comentário afixado deste vídeo.
A segunda coisa que essa luz pode ser, se não for tão brilhante assim, a ponto de ser tão brilhante quanto qualquer estrela, é muito provável que seja um satélite. Satélites orbitam a milhares de quilômetros de altura, de tal forma que a luz do Sol pode refletir neles, ricochetear de volta para nós e nos permitir vê-los mesmo durante a mais escura noite. Em 2018, foi estimado que haviam cerca de 5.000 satélites orbitando a Terra, e hoje este número é muito maior, especialmente com os milhares de satélites da Starlink colocados em órbita frequentemente. Assim, vê-los no céu noturno é relativamente comum, especialmente se você vir uma fileira de pequenos pontos de luz.
Mas agora, e se o comportamento da luz que você está observando for diferente, ou seja, se ela aparece e depois desaparece? Se essa oscilação for muito rápida, pode ser que você queira fazer um pedido, já que você provavelmente deve estar vendo Estela Cadente, que é um pequeno grão de poeira espacial que, ao ser atraída para superfície da Terra devido à gravidade, queimou na atmosfera. Você pode ver estrelas cadentes com uma frequência maior em certas épocas do ano, como em algumas famosas chuvas de meteoros, como a Perseidas.
Agora, se você está vendo algo semelhante a uma destas estrelas cadentes, mas o brilho emitido é muito mais intenso, você provavelmente está olhando para um bólido, que é semelhante a uma estrela cadente, mas agora não com um simples grão de poeira espacial, e sim de algo maior, como um pequeno meteorito.
Se a luz que você está observando aparecer e depois desaparecer, muito devagar, ou o contrário, pode ser que você esteja olhando para um satélite entrando ou saindo da sombra da Terra. Essa sombra não é reta, parecendo mais como um cone devido aos efeitos atmosféricos de difração da luz. Isso faz com que satélites em órbitas muito altas estejam em uma área com luz, enquanto você, aqui na superfície, está no meio da noite. O satélite se move em sua órbita, e quando entra na sombra da Terra, percebemos isso ao ver a luz se apagar ou desbotar. O contrário também ocorre. Satélites saindo da sombra da Terra se manifestam como uma luz que surge ou se intensifica do nada.
Há ainda alguns satélites que, devido a posição de seus painéis solares, e também devido ao seu movimento de giro enquanto segue sua órbita, podem refletir a luz do sol apenas durante o tempo em que a placa está em um ângulo bastante exato. Isso acontecia bastante com as primeiras gerações de satélites Iridum, mas isso acabou em 2020, com a substituição de todos eles por uma nova geração de satélites que não refletem mais a luz desta forma.
A última coisa que você deve observar enquanto estiver vendo uma luz estranha no céu noturno é que, se ela piscar muito, uma possível explicação é que se trata de um satélite com alta rotação. Embora uma série de coincidências com a posição relativa do satélite e a sua como observador devam ocorrer.
Agora, se nenhum dos pontos aqui listados corresponde ao que você está observando, então você pode começar a suspeitar que viu um legítimo OVNI.
Mas lembre-se de que um OVNI não é necessariamente uma espaçonave ou manifestação extraterrestre. Você pode estar olhando para algo com muitas outras potenciais explicações prosaicas, como drones, balões, aves, insetos e aeronaves dos mais diferentes e exóticos tipos, que podem causar confusão até mesmo em cientistas e observadores altamente treinados.
Tome cuidado com os vídeos que assiste, pois há um interesse muito grande em viralizar de maneira sensacionalista vídeos desta natureza. Isso ocorre desde o início da era moderna da ufologia nos anos 1940, e se intensifica ano a ano com cada vez mais vídeos de coisas comuns que são taxadas de fantásticas, isso quando não são de fato produções intencionalmente falsas.
Espero que este pequeno guia tenha lhe ajudado a compreender melhor os céus e as coisas fascinantes que podemos ver nele todos os dias e noites.
Um forte abraço a você, e até a próxima!
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